sábado, 8 de agosto de 2009

Pedro Malasartes e as três botijas de azeite


Um dia, Pedro Malasartes foi ter com o rei e lhe pediu três botijas de azeite, prometendo-lhe levar em troca três mulatas moças e bonitas. O rei aceitou o negócio.
Pedro saiu e foi ter à casa de uma velha, ali pela noitinha; pediu-lhe um rancho, e que lhe botasse as botijas no poleiro das galinhas. A velha concordou com tudo. Alta noite, Pedro Malasartes levantou-se, foi de pontinha de pé ao poleiro, quebrou as botijas, derramou o azeite, lambuzando as galinhas. De manhã muito cedo Malasartes acordou a velha, e pediu-lhe as botijas de azeite. A velha foi buscá-las, e, achando-as quebradas, disse: "Pedro, as galinhas quebraram as botijas e derramaram o azeite." "Não quero saber disso", disse Pedro, "quero aqui meu azeite, senão quero três galinhas."

A velha ficou com medo, deu-lhe as três galinhas. Malasartes partiu e foi à noite à casa de outra velha; pediu abrigo e que agasalhasse aquelas três galinhas entre os perus. A velha, como tola, consentiu. Alta noite, Pedro se levantou, foi ao quintal e matou as três galinhas, besuntando de sangue os perus. No dia seguinte, bem cedo, acordou a velha, pedindo as suas galinhas, porque queria seguir viagem. A velha foi buscá-las e encontrou-as mortas: voltou aflita, contando a Malasartes. Ele fez um grande barulho até levar seis perus em troca das galinhas.

Na noite seguinte, foi ter à casa de um homem que tinha um chiqueiro de ovelhas, e pediu-lhe para passar a noite em sua casa e que lhe agasalhasse aqueles perus lá no chiqueiro das ovelhas, porque bicho com bicho se acomodavam bem. O homem assim fez. Tarde da noite, Pedro foi ao lugar onde estavam os perus e matou-os a todos, lambregando de sangue as ovelhas. Pela manhã levantou-se bem cedo e pediu ao dono da casa seus perus. O homem, indo-os buscar, achou-os mortos, e voltou muito aflito, dizendo:

"Pedro não sabe? As ovelhas mataram os seus perus. Ouvindo isto, Malasartes fez um grande espalhafato, gritando que o homem havia matado os perus do rei e recebeu seis ovelhas pelos perus.

Largou-se, indo dormir na casa de um homem que tinha um curral de bois. Ai ele fez as mesmas artimanhas, até pegar seis bois pelas ovelhas. Mais adiante ele encontrou uns vendilhões de ouro e trocou os bois por ouro. Mais adiante, encontrou uns homens que iam carregando uma rede com um defunto. Pedro perguntou quem era, disseram-lhe que era uma moça. Ele pediu para ir enterrá-la e eles deixaram. Logo que os homens se ausentaram ele tirou a moça da rede, encheu-a de bastante ouro e enfeite, e foi ter com ela nas costas à casa de um homem rico que havia ali perto. Pediu rancho, disse às filhas do tal homem que aquela era a filha do rei que estava doente, e ele andava passeando com ela, então pediu que a fossem deitar. Foram levar a moça para uma alcova, indo Malasartes com ela, dizendo que só com ele, ela se acomodava. Deitou a moça defunta na cama e retirou-se, dizendo às donas da casa:

"Ela custa muito a dormir, ainda chora como se fosse uma criança; quando chorar, metam-lhe a correia."

Alta noite, Pedro foi e se escondeu debaixo da cama onde estava a morta e pôs-se a chorar como menino. As moças da casa, supondo ser a filha do rei, deram-lhe muito até ela se calar, que foi quando Pedro se calou. Depois ele escapuliu e foi para seu quarto. De manhã ele pediu a filha do rei, e nada de a poderem acordar. Afinal perceberam que estava morta, e informaram a Malasartes. Ele pôs as mãos na cabeça, dizendo:

"Estou perdido; vou para a forca; me mataram a filha do rei!"

Os donos da casa ficaram muito aflitos e começaram a oferecer coisas pela moça, e Pedro sem querer aceitar nada, até que ele mesmo exigiu três mulatas das mais moças e bonitas. O homem rico as deu, e Pedro disse que dava uma desculpa ao rei sobre a morte da sua filha, e lhe dava de presente as três mulatas, para o rei não se agastar muito.

Malasartes largou-se e foi logo para o palácio, onde entregou ao rei as três mulatas com este dito: "Eu não disse a vossa majestade que lhe dava três mulatas pelas três botijas de azeite? Aí estão elas."

E o rei ficou muito admirado.


(Fonte: http://www.contos-web.com.br/home.html)

segunda-feira, 3 de agosto de 2009

A galinha que criava um ratinho



Lá em cima daquele morro tem uma casinha branca, com teto de sapê. È tão pequenina que nem dá para ver daqui. Mas eu sei que tem, porque quando eu era pequena, assim que nem você, minha mãe me disse que tinha, e me contou a história que tinha acontecido nessa casa. Uma história que minha avó contou pra ela e eu vou contar pra você.
Nessa tal casa, há muito tempo, moravam um galo e uma galinha. Eles não tinham pintinhos e, como queriam ter muitos filhos, pegaram um ratinho pra criar. Cuidavam dele com todo carinho e dengo: davam comida, banho gostoso, contavam história, cantavam música, inventavam brincadeira, davam beijo (de bico), abraço (de asa) e faziam cafuné (do jeito bom que você imaginar).
Um dia, depois do almoço, a galinha foi lavar louça no rio. Antes de sair, recomendou:
_ Não abram a porta sem saber quem é. A raposa anda pelas redondezas...
Daí a pouco, bateram na porta:
PAM! PAM! PAM!
O galo tinha comido muito no almoço: caldo de canjica, bife de minhoca, salada de talo de couve, angu de fubá, bolo de milho. Depois, sentou na cadeira de balanço, pôs os óculos e ficou lendo jornal. Foi ficando com tanta moleza, que quando ouviu as batidas nem lembrou do que a galinha tinha dito e mandou:
_ Abre ali, meu filho.
O ratinho, que era muito rápido, num instante abriu. E a raposa _ porque era ela, como você já adivinhou_ ainda mais rápida, num instantinho menor ainda, viu que aquele ratinho não interessava, que ela só gostava de comer bicho de pena. Mas, num instantinho menorzinho que tudo, deu um pulo e comeu o galo inteirinho, de uma bocada só. Com jornal, óculos e até a cadeira de balanço. E foi embora.
O ratinho saiu correndo, entrou por um atalho e logo encontrou a galinha que já vinha voltando.
_ Mãe, você, que dá jeito em tudo, vai ter que dar jeito numa coisa terrível...
Contou logo o que havia havido. Pode ser que, se pudesse, a galinha tivesse chorado e arrancado as penas. Mas não dava tempo para fricote. Por isso, ela falou:
_ Vai em casa correndo, pega a minha cestinha de costura e uma garrafa de cachaça. Depressa!
O ratinho foi.
Aí, a galinha deixou a garrafa de cachaça bem no meio da estrada e se escondeu atrás de uma árvore, com o filho.
A raposa apareceu e viu a garrafa:
_ Oba! Nada como uma pinguinha para ajudar a digestão do almoço...
E bebeu a garrafa toda. Claro, ficou bêbeda. Resolveu descansar na sombra de uma árvore. Num minuto estava roncando. A galinha aproveitou, abriu a cesta de costura, tirou a tesoura, cortou a barriga da raposa e tirou o galo lá de dentro. Ele saiu com o jornal todo amassado, os óculos entortados, a cadeira sem balanço, e não entendia o que tinha acontecido. Ficou resmungando:
_ Quem foi que apagou a luz de repente?
Nem deu tempo de explicar que ninguém tinha apagado luz nenhuma, era só escuridão de dentro da barriga da raposa. Agora todos tinham que ajudar:
A galinha dava as ordens:
_ Ponham aquela pedra na barriga dela!
Eles puseram. A galinha foi costurando. Bem a tempo, porque a raposa já estava se espreguiçando, com jeito de acordar.
Os três correram e se esconderam.
_ Que sede! _ reclamou a raposa.
_ Acho que aquele galo estava muito velho, está pesando muito no meu estômago... Vou beber água.
Ainda tonta de tanta cachaça, foi até o rio. O dia estava quente, ela acabou entrando na água pra se refrescar.
A pedra pesava muito, foi afundando, e a correnteza foi levando a raposa, levando, levando. Deve estar levando até hoje, se é que já não chegou ao mar...
A galinha, o galo e o ratinho voltaram para casa. E o galo aprendeu que pai não tem nada de ficar mandando filho fazer as coisas só porque ele está com preguiça de levantar.
Um dia, a mulher pode não estar por perto para dar um jeito e ele pode se dar muito mal.

Ana Maria Machado.
História enviada por Neusa Lucia Braga Cia