quarta-feira, 9 de fevereiro de 2022

Conversinha mineira

 


Conversinha mineira

- É bom mesmo o cafezinho daqui, meu amigo?

- Sei dizer não senhor: não tomo café.

- Você é dono do café, não sabe dizer?

- Ninguém tem reclamado dele não senhor.

- Então me dá café com leite, pão e manteiga.

- Café com leite só se for sem leite.

- Não tem leite?

- Hoje, não senhor.

- Por que hoje não?

- Porque hoje o leiteiro não veio.

- Ontem ele veio?

- Ontem não.

- Quando é que ele vem?

- Tem dia certo não senhor. Às vezes vem, às vezes não vem. Só que no dia que devia vir em geral não vem.

- Mas ali fora está escrito "Leiteria"!

- Ah, isto está sim senhor.

- Quando é que tem leite? 

- Quando leiteiro vem.

- Tem ali um sujeito comendo coalhada. É feita de quê? 

- O quê: coalhada? Então o senhor não sabe de que é feita a coalhada?

- Está bem, você ganhou. Me traz um café com leite sem leite. Escuta uma coisa: como é que vai indo a política aqui na sua cidade? :

- Sei dizer não senhor: eu não sou daqui.

- E há quanto tempo o senhor mora aqui?

- Vai para uns quinze anos. Isto é, não posso garantir com certeza: um pouco mais, um pouco menos.

- Já dava para saber como vai indo a situação, não acha?

- Ah, o senhor fala a situação? Dizem que vai bem.

- Para que Partido.

- Para todos os Partidos, parece.

- Eu gostaria de saber quem é que vai ganhar a eleição aqui.

- Eu também gostaria. Uns falam que é um, outros falam que outro. Nessa mexida...

- E o Prefeito?

- Que é que tem o Prefeito?

- Que tal é o Prefeito daqui?

- O Prefeito? É tal e qual eles falam dele.

-  Que é que falam dele?

- Dele? Uai, esse trem todo que falam de tudo quanto é Prefeito.

-Você, certamente, já tem candidato.

-Quem, eu? Estou esperando as plataformas.

- Mas tem ali o retraio de um candidato dependurado na parede, que his­tória é essa?

- Aonde, ali? Ué, gente: penduraram isso aí...

 

(Em Para Gostar de Ler, v. 7. São Paulo, Ática, 1979.)


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