domingo, 27 de fevereiro de 2022

“Os duendes” (Irmãos Grimm)


 


Um sapateiro tinha ficado muito pobre, sem que lhe coubesse a culpa. E, por fim, só lhe restava um pedaço de couro, para um único par de sapatos. Cortou-o à  noite, a fim de aprontá-lo na manhã seguinte e, como tinha a consciência tranquila,  deitou-se calmamente, fez as suas orações e adormeceu. No outro dia, depois da prece  matinal, quando ia sentar-se para iniciar o trabalho, viu os sapatos, prontinhos, em  cima da mesa. Ficou assombrado, sem encontrar explicação para aquilo. Tomou-os nas mãos e examinou-os cuidadosamente. Haviam sido feitos com tal capricho, sem  nenhum ponto errado, que pareciam uma verdadeira obra de arte.

Logo depois entrou um freguês e, como os sapatos lhe agradassem muito,  pagou mais por eles. Com esse dinheiro, o sapateiro pode comprar couro para dois  pares. Cortou-os à noite, disposto a trabalhar neles no dia seguinte. Mas não foi  preciso: ao levantar-se, lá estavam eles, prontinhos da silva. E também não faltaram os  compradores, que lhe deram dinheiro suficiente para que adquirisse couro para quatro  pares. Também a esses ele encontrou terminados no outro dia.

E assim continuou acontecendo. O calçado que cortava à noite, encontrava concluído na manhã seguinte.

Começou a ter boa renda e, por fim, tornou-se um homem rico.

Certa noite, pouco antes do Natal, o sapateiro, que já havia cortado o couro  para o próximo dia, antes de deitar-se, disse à mulher:

 - Que tal se esta noite ficássemos acordados para ver quem nos presta tão  grande auxílio?

A mulher concordou e foi acender uma vela. Depois o casal escondeu-se num  canto da sala, atrás de umas roupas ali penduradas.

Ao soar a meia-noite, apareceram dois ágeis e graciosos homenzinhos, muito   pequeninos e sem roupa alguma, que se sentaram à mesa do sapateiro. Apanharam  todo o couro cortado e, com seus dedinhos, se puseram a costurar, bater e puxar o fio  com tanta ligeireza que o sapateiro, assombrado, mal podia acreditar nos seus olhos.

Não cessaram até que tudo estivesse pronto e depois desapareceram rapidamente

No dia seguinte, a mulher disse:

 - Os anõezinhos nos tornaram ricos e devemos mostrar-lhes a nossa gratidão.  Com certeza sentem muito frio, andando assim nuzinhos, sem nada em cima do corpo.  Sabes de uma coisa? Farei para cada um deles uma camisinha, um casaco, colete e calça, e um par de meias de tricô. Tu poderás fazer-lhes uns sapatos.

Ao que lhe respondeu o homem:

 - Parece-me boa ideia!

E, à noite, em vez de couro cortado, puseram os presentes sobre a mesa  depois esconderam-se para ver o que fariam os homenzinhos.

À meia-noite chegaram eles, saltitando, e logo se dispuseram a começar o  trabalho. Quando, porém, em vez de couro cortado, encontraram as graciosas peças  de roupa, ficaram no princípio admirados, mas logo mostraram imensa alegria.

Vestiram-se com incrível rapidez e, alisando as roupas no corpo, puseram-se a cantar:

“Não somos rapazes bonitos e elegantes?

Por que continuarmos sapateiros como antes?”

Depois saltaram e dançaram, brincando em cima de cadeiras e bancos. Por fim, saíram dançando porta fora. Desse dia em diante, nunca mais apareceram. Mas o  sapateiro viveu bem pelo resto de sua vida e sempre teve sorte em todos os negócios  que fez.


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