quarta-feira, 30 de março de 2022

O Caldeireiro

 

 

 


Um caldeireiro foi contratado para consertar um enorme sistema de caldeiras de um navio a vapor que não estava funcionando bem. Após escutar a descrição feita pelo engenheiro quanto aos problemas e de haver feito umas poucas perguntas, dirigiu-se à sala de máquinas. Olhou, durante alguns instantes, para o labirinto de tubos retorcidos. A seguir, pôs-se a escutar o ruído surdo das caldeiras e o silvo do vapor que escapava. Com as mãos apalpou alguns tubos. Depois, cantarolando suavemente só para si, procurou em seu avental alguma coisa e tirou de lá um pequeno martelo, com o qual bateu apenas uma vez em uma válvula vermelha. Imediatamente, o sistema inteiro começou a trabalhar com perfeição e o caldeireiro voltou para casa.

Quando o dono do navio recebeu uma conta de R$ 2.000,00 queixou-se de que o caldeireiro só havia ficado na sala de máquinas durante quinze minutos e solicitou uma conta pormenorizada.

Eis o que o caldeireiro lhe enviou:

Total ................: R$ 2.000,00

Martelada ..........: R$       0,50

Onde martelar ....: R$ 1.999,50

 

fonte: http://paxprofundis.org/livros/parabolas/parabolas.html

quinta-feira, 24 de março de 2022

O Catavento




Um cata vento voando no céu
la fora o vento e 2 barcos de papel
O puro encanto para quem olha distante ao léu
O Sol o Céu as Estrelas e o Luar

E o cata vento sobrevoa mais uma casa ao luar
procurando um coração, para o seu objetivo alcançar

O mar escureceu e para o céu você se vendeu
as estrelas começaram a brilhar...
Há... meu amor enquanto elas brilharem saberei
que estás comigo até se eles não deixarem

E o cata vento sobrevoa mais uma casa ao luar
procurando um coração, para o seu objetivo alcançar

quarta-feira, 16 de março de 2022

História de assombração

 



Mário Neme

Pois não é que eles vinham vindo pela estrada fria, Nhô Be e Chico, dois homens. Vinham vindo pelo estradão sem fim, naquela noite amarga de escura, nem uma estrela no céu, nenhuma claridade, tudo negro, tudo medonho. Era quase meia-noite e eles vinham vindo, só com o facão na cintura, voltando pro rancho.

Nisso estavam chegando perto da casa do defunto Miguelangelo, uma tapera, abandonada, que de noite apareciam lá não sei quantas almas do outro mundo. Muita gente já tinha visto as tais almas cantando, tinha dado tiro nelas, mas a bala não pegava. Uma tocava viola, uma viola chorosa e bem afinada, mas ninguém via a viola. Coisa misteriosa. Era mesmo daquelas assombrações que a gente respeita e passa longe, evita elas, mas, Nhô Be não acreditava "nessas bobagens não".

— Isso de assombração é besteira, Chico.

— Se é, compadre.

— Pois eu não acredito nisso e acho que é até pecado acreditar. O pessoal lá em casa é meio besta, acredita, isto é, a mulherada que é meio besta.

— Em casa também, compadre.

—Negadinha boba, Chico. Donde se viu?! Eu nunca tive medo dessas invenções.

— Nem eu, Nhô Be, nem eu.

Eu estava orgulhoso de ver dois bravos com essa coragem formidável, isso sim, era gente pra pôr num conto, até dava gosto lidar com eles. Precisava ver quando, daí a pouco, desabou uma tempestade de acabar o mundo, daquelas mesmo de lavar a terra e a gente não se agüentar em pé debaixo dela.

Chuáaa, e a aguaceira caía que não era vida! Então, os dois homens estavam bem pertinho da casa mal-assombrada, onde tinham matado o defunto Miguelangelo. Foi uma barbaridade aquela morte, quebraram os dentes dele, quebraram os dedos dos pés e das mãos e depois deixaram o velho ir morrendo devagarinho, naquele sofrimento, que só aquilo merecia o céu.

Estavam mesmo na frente da casa, e a chuva de não se agüentar em­
baixo. Nhô Be falou para o companheiro:                                                           

— Acho que é melhor a gente entrar na casa e esperar passar a chuva, Chico.

— Mas é que essa casa tem uma fama desgraçada, compadre...

— O que tem isso, Chico? Pois a gente não tem medo de assombração.

— Ah! É mesmo, compadre! Então vamos.

E foram. Entraram sem abrir a porta, porque não tinha porta mais, nem j anela.

Mas entraram com muita precaução, espiaram pra dentro, foram andando de manso, chegaram no centro da casa, juntaram uns gravetos, e tal, e fizeram fogo.

O fogo eles disseram, lá entre eles, que era para esquentar o corpo, mas eu desconfio que era pra espantar as almas do outro mundo. Porque, francamente, eles não estavam muito firmes, não. Coragem eles tinham e bastante, mas, numa hora dessas, num lugar assim de má fama, meia-noite, aquela chuva torvando, aquela casa escangalhada, a gente fica mesmo meio esquerda. Mas eles estavam ali, firmes.

De repente, um barulhinho esquisito, que nem gente que pisa disfarçado. Os dois estavam agachados na frente do foguinho, nessa hora arregalaram os olhos, ficaram assustando pro lado do barulho, que era no vão da porta.

Pra dizer a verdade, estavam com os olhos deste tamanho, olhavam um pró outro e depois pra porta. Outro barulhinho mais perto e apareceu

Uma sombra se mexendo na porta. Nhô Be puxou a faca da cintura. Chico segurou a "pernambucana" e ficou pronto pra enfrentar o bicho. Mas, porém, o bicho não era "aquele bicho". Era um franguinho. O pobre vi­nha todo molhado, pingando chuva, querendo encontrar um cantinho pra se esquentar. Aquilo foi um contentamento prós dois, um alívio pra eles, até para mim que não tinha nada com o caso. Não é que eles tivessem medo, mas, numa hora daquelas, aquele barulho na porta, um negócio assim que vinha agachado prô lado deles, era mesmo pra gente arregalar os olhos e parar a suspiração.

— Está vendo, Chico, se a gente tivesse medo podia até morrer de susto agora, pois é só um franguinho.

— Pois é, compadre, um franguinho, um franguinho, compadre...

O franguinho veio vindo, chegou perto do fogo, chacoalhou as asas, esticou o pescoço pra cima, fez assim uma carinha de gente e falou prós dois com voz de trovão:

— PUXA VIDA, COMO ESTÁ CHOVENDO, NÃO?



sábado, 12 de março de 2022

A parábola de Chuang-Tzu


 Chuang-Tzu sonhou que era uma borboleta e, ao despertar, não sabia se era um homem que havia sonhado ser uma borboleta ou uma borboleta que agora sonhava ser homem.

 

 Jorge Luis Borges, Buda, Rio de Janeiro: Editora



Bertrand Brasil, 1993


quinta-feira, 3 de março de 2022

Chuva e o Fogo

 


          

Contam os antigos que, num tempo distante e em terras mais distantes ainda, existia no "Vale do Fogo Ardente", um jovem foguinho conhecido por FOGARÉU. E, ao sul desse Vale, existia ali a "Terra da Garoa" onde vivia uma Chuvinha linda, linda! Todas as tardes, Fogaréu observava do alto de uma encosta rochosa a linda Chuvinha brincando lá longe, lançando suas águas de encontro à mata, dando assim, com os raios do sol, a ilusão de uma linda cachoeira de diamantes. Fogaréu se encantava com aquela cena e a cada dia, seu coração ardia não de fogo, mas de paixão. Do outro lado, Chuvinha também se derretia de paixão, olhando Fogaréu com suas chamas vermelhas balançando ao vento.

 

Certa vez, Fogaréu resolveu declarar sua paixão por Chuvinha à sua amiga Águia que também, todas as tardes, sobrevoava lá do alto, o Vale do Fogo Ardente. Muito comovida, a amiga Águia pensou em promover um encontro entre Fogaréu e Chuvinha. Em meio a tanta alegria, Fogaréu de repente se abateu, porque não sabia como isso poderia acontecer, já que no Vale do Fogo Ardente nunca podia chover e na Terra da Garoa Fogaréu não podia entrar. A amiga Águia pensou, voou, pensou e num bater de asas, EUREKA!!! Muito animada, lá de cima a amiga Águia disse a Fogaréu:

 - Fogaréu?! Vamos falar com a Mãe Natureza e promover esse encontro ali na Floresta que divide as duas terras. Vamos realizar esse encontro na terra onde tudo pode acontecer, na "Terra do Faz de Conta". Sem pestanejar, Fogaréu adorou a idéia e a amiga Águia mais que depressa voou até a Terra do Faz de Conta para conversar com a Mãe Natureza sobre o encontro.

 Ao receber o pedido de Fogaréu, trazido por D. Águia, Mãe Natureza ficou muito preocupada porque temia pela segurança dos animais da Terra do Faz de Conta, temendo ainda um incêndio provocado por Fogaréu. O Papagaio, o bichinho mais curioso e fofoqueiro da floresta, ouvindo tudo atrás de uma bananeira, não perdeu tempo e espalhou a notícia:

 - Purutaco, tataco, FOGARÉU e CHUVINHA vão se encontrar aqui na Terra do Faz de Conta. Os animais alvoroçados foram diretamente ao encontro da Mãe Natureza para saber sobre a notícia que se espalhara. A grande dúvida, ou melhor, o grande medo era onde, dentro da Terra do Faz de Conta, esse encontro poderia acontecer. Fala daqui, reclama dali, quando o Dom Calango, deu um grito dizendo:

 - Silênnnnciooooooo!!!! Eu sei onde Fogaréu e Chuvinha podem se encontrar. Só tem um lugar dentro da Terra do Faz de Conta que não oferecerá muito perigo e esse lugar está bem no centro da Floresta. É lá nas rochas dos calangos, cobras e lagartos.

 A Mãe Natureza, ainda muito receosa mas, com seu grande coração de mãe acatou a idéia e até marcou a data do encontro: 12 de junho, em comemoração ao dia de todos os animais apaixonados. Faltando apenas três dias para o encontro, todos os animais já estavam sabendo pois, o Elefante com sua tromba, anunciava por toda a mata como se fosse um carro de som. O macaco pulando de galho em galho, aproveitava a oportunidade para vender ingressos dos melhores lugares em cima das copas das árvores. A hiena, essa só sabia rir e dizer a todos que esse encontro não ia acabar bem mas que mesmo assim, ia estar lá para presenciar esse desfecho. O bicho Preguiça, com medo de perder esse espetáculo amoroso, comprou um ingresso do macaco e tratou logo de já ir andando, com toda sua paciência, para chegar a tempo do grande espetáculo. Um bando de andorinhas, a convite de seus primos pardais, veio de muito longe, viajando milhas só para assistirem a cerimônia amorosa. O Rei Leão rapidinho procurou D. Aranha, costureira de sucesso por toda a região, pedindo a mesma que fizesse uma linda túnica real com suas teias finas e reluzentes como ouro. Enfim, todos os animais se manifestavam ansiosos e felizes com o encontro de Fogaréu e Chuvinha.

 E por falar nos dois, Fogaréu e Chuvinha, muito emocionados também se preparavam para o encontro. Ele, o Fogaréu tratou logo de se esticar sob o sol e dar uma queimadinha, para manter o bronzeado. Ela, a Chuvinha, preferiu tomar um banho de Chuva de Rosas com ervas silvestres. Ah! A amiga Águia, essa fora convidada pelo casal de namorados para fazer o papel de mestre de cerimônia da nova união. Tudo pronto, público presente no grande palco do evento, D. Águia abre o espetáculo convidando a Orquestra Filarmônica da Grande Floresta, composta pelos tenores Sabiá e D. Cigarra e pelos sopranos Bem-te-vi e D. Sariema, além dos demais músicos, como D. Coruja e Sr. Raposão, tudo isto sob a regência do Maestro Galo de Viena para, assim tocarem "Danúbio Azul" durante a entrada dos namorados. Logo após a entrada de Fogaréu e Chuvinha, chega a hora de ambos se apresentarem um para o outro e para toda a bicharada. Fogaréu, em meio a grande emoção assim exclamou:

 

- Querida Chuvinha, queria poder te esquentar em meus braços mas, como o Destino assim não me permite, saiba que apenas uma de suas gotas que cair sobre meu coração, servirá como bálsamo para transformar essa paixão ardente em Amor escaldante.

 

Todos os animais se levantaram para aplaudir Fogaréu. A mamãe Ursa, mal se continha de tanto chorar. O silêncio mais uma vez tomou conta da Terra do Faz de Conta. Era a vez de todos ouvirem Chuvinha e, foi dessa forma que ela falou:

 - Amado Fogaréu, há tempos em que derramo gotas lacrimejantes de paixão por você. Não me sentiria derrotada se para ficar contigo tivesse que secar-me toda, acabando com toda minha água, pois, o meu Amor por você mergulha cada dia mais fundo dentro das águas de minha alma. Te amo!!! Mais choro, mais emoção.

 Os animais pulavam sobre os galhos das árvores, fazendo com que estas derramassem suas folhas sobre o os namorados. De repente, o bicho Preguiça, que ainda subia na árvore, chega até seu galho que, naquele momento, estava lotado de animais. Arreda daqui, espreme de lá. Epa, que barulho é esse, gritou o chimpanzé! Cleck, crack, esse galho vai quebrar retrucou o Esquilo. Os bichos apavorados com a situação se desesperaram e sem que esses pudessem descer, a girafa gritou: Madeeeiiiiraaaaaa!!!! O galho imenso, daquela árvore maior ainda, veio caindo, caindo e para infelicidade geral, esse caiu bem em cima de Fogaréu que, sem querer, espalhou suas chamas pelo galho, que também as fez espalhar para outros galhos de outras árvores, começando assim um incêndio na Terra do Faz de Conta. Os animais apavorados, corriam descontroladamente. O Elefante que antes anunciava o Grande Encontro, só gritava: Salve-se quem puder!!! E Fogaréu, coitado, a cada movimento de desespero seu espalhava mais fogo ainda pela floresta. A mãe Natureza, chorando muito, chamou D. Águia para que essa dissesse a Chuvinha para jogar água, bastante água e bem forte sobre tudo que estava lá em baixo, pois só assim, o incêndio não devastaria toda a mata e nem mataria nenhum animal. Ao receber a ordem, Chuvinha disse que não poderia fazer isto, porque acabaria com Fogaréu, o grande amor de sua vida. Mas e os animais? E a floresta? Perguntou D. Águia. Lá em baixo, bem no centro do grande tumulto, uma voz ecoa alto, chegando através do vento nos ouvidos de Chuvinha. Era Fogaréu que gritava assim:

 - Chuvinha meu amor, use suas águas e acabe com o mal que provoquei. Mesmo que eu morra, você viverá comigo na eternidade e espero que eu também viva com você em suas lembranças.

 Chuvinha, triste, bastante triste, começou a chorar e foi esse seu choro que soprado pelo vento, começou a molhar a Terra do Faz de Conta. A cada gota que caía, Chuvinha não se continha e chorava mais forte, fazendo com que mais forte suas lágrimas caíssem sobre a terra. Chorou, chorou e quando esta se deu conta que o incêndio estava acabando e o que é pior, que FOGARÉU estava desaparecendo, caiu profundamente em um pranto incontrolável, chorando até a última de sua gota. Passado o tormento, os animais que haviam se escondido, voltaram para o centro da Floresta, o palco do espetáculo. Só que dessa vez, as estrelas do show não se encontravam mais lá. Fogaréu acabara de ser morto por Chuvinha e ela, também morrera porque não resistiu a dor de ter assim matado seu grande amor e chorou até secar todas suas águas. Mas, de repente, o rei Leão pede silêncio a todos e lá no céu, com a fumaça que subira dos restos queimados por Fogaréu e apagados por chuvinha, todos os bichos avistaram uma mensagem que se formou e dizia assim:

 - MESMO QUE NÓS NÃO ESTEJAMOS MAIS JUNTOS AQUI, MESMO QUE NOSSAS VIDAS JÁ NÃO SEJAM MAIS VIVIDAS POR NÓS, ESTAMOS JUNTOS NA ETERNIDADE DE NOSSAS ALMAS, PORQUE PODEM CALAR NOSSAS VOZES, MAS, NUNCA PODERÃO SILENCIAR NOSSO GRITO DE AMOR.

 Contribuição de Rinaldo Cláudio Guimarães Integrante do Grupo "Encantadores de Histórias".

terça-feira, 1 de março de 2022

Águas de Março


É pau, é pedra, é o fim do caminho
É um resto de toco, é um pouco sozinho
É um caco de vidro, é a vida, é o Sol
É a noite, é a morte, é o laço, é o anzol
É peroba do campo, é o nó da madeira
Caingá, candeia, é o Matita Pereira
É madeira de vento, tombo da ribanceira
É o mistério profundo, é o queira ou não queira

 

É o vento ventando, é o fim da ladeira
É a viga, é o vão, festa da cumeeira
É a chuva chovendo, é conversa ribeira
Das águas de março, é o fim da canseira
É o pé, é o chão, é a marcha estradeira
Passarinho na mão, pedra de atiradeira
É uma ave no céu, é uma ave no chão
É um regato, é uma fonte, é um pedaço de pão

 

É o fundo do poço, é o fim do caminho
No rosto, o desgosto, é um pouco sozinho
É um estrepe, é um prego, é uma ponta, é um ponto
É um pingo pingando, é uma conta, é um conto
É um peixe, é um gesto, é uma prata brilhando
É a luz da manhã, é o tijolo chegando
É a lenha, é o dia, é o fim da picada
É a garrafa de cana, o estilhaço na estrada

 

É o projeto da casa, é o corpo na cama
É o carro enguiçado, é a lama, é a lama
É um passo, é uma ponte, é um sapo, é uma rã
É um resto de mato, na luz da manhã
São as águas de março fechando o verão
É a promessa de vida no teu coração

 

É uma cobra, é um pau, é João, é José
É um espinho na mão, é um corte no pé
São as águas de março fechando o verão
É a promessa de vida no teu coração

 

É pau, é pedra, é o fim do caminho
É um resto de toco, é um pouco sozinho
É um passo, é uma ponte, é um sapo, é uma rã
É um belo horizonte, é uma febre terçã
São as águas de março fechando o verão
É a promessa de vida no teu coração

 

Au, edra, im, minho
Esto, oco, ouco, inho
Aco, idro, ida, ol, oite, orte, aço, zol
São as águas de março fechando o verão
É a promessa de vida no teu coração