segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

A Festa de Pedro Malasartes

Era aniversário de Pedro Malasartes, que adorava uma festa. Malasartes estava sem dinheiro, mas o primo dele tinha muito dinheiro e certamente o receberia bem apesar de ser um pouco pão duro. Foi até a fazenda do primo, que o recebeu entusiasmado por economizar assim a viagem. Pedro entrou rápido e o primo foi logo oferecendo:

- Ora, Pedro, tenho aqui uma broa que sinhá assou, fresquinha. É tanta que vai durar a semana inteira.
- Broa de milho, primo?

- É sim, quer um pedaço?
Malasartes agradeceu humilde:

- Não, primo, basta um cafezinho.

- Mas é seu aniversário homem, eu reconheço que sou um pouco parcimonioso, mas um pouco de cortesia não faz mal! Se quiser é só pediu.

Malasartes agradeceu, mas continuou só com o café. Continuaram conversando e o primo ofereceu:

- Olha Pedro, ontem mandei matar aquele leitão capado que eu vinha engordando. Temos uma porção de torresmo e toucinho frescos que mandei preparar. Quer um pouco, pois tenho bastante?

- Tem muito mesmo?

- Sim bastante, quer?

- Nada primo, pode deixar, basta um cafezinho.

- Tudo bem, mas quando quiser é só pedir. O primo pareceu satisfeito e foram proseando mais e mais até que o primo ofereceu de novo:

- Pedro, faz tempo que tenho guardado umas garrafas de cachaça para beber.

- E é dá boa?
- Da melhor. Vamos fazer um brinde?

- Não primo, para mim basta um cafezinho.

- Não se faça de rogado que você ta quase em casa. Quando ficar com vontade é só pedir.

E assim, o primo de Pedro Malasartes, pelas boas normas da cortesia que regiam aquele lugar e motivado pelo fato de Malasartes não parecer querer gastar nada foi oferecendo um pouco de cada coisa que tinha na despensa. E Malasartes ouvia e recusava se contentando com um cafezinho. Nessa toada foram até que ouviram uma batida tímida na porta. O primo de Malasartes se levantou e abriu a porta vendo do lado de fora uma verdadeira multidão de conhecidos. O primeiro foi logo falando:
- Olha, desculpa a intrusão, mas ficamos sabendo que Pedro Malasartes estava por aqui e passamos só para dar os parabéns.

O primo desconfiado, mas sem ter como recusar uma simples cortesia convidou todos para entrar e na hora que já preparava para falar:

- Olha, eu sinto muito meus amigos, mas não tenho quase nada na despensa...

Malasartes foi logo falando, deixando de lado o cafezinho:

- Oh, primo, sabe aquele torresmo, toucinho, broa, cachaça, suco de laranja, rosca, lingüiça, e tudo mais que você ofereceu? Agora eu até quero um pouquinho, que já me cansei desse café que eu tomava até o pessoal chegar...

E o primo engasgou e uma vez que o oferecido estava em vigor, acabou bancando, toda a festa de Pedro Malasartes.
(História postada por Amauri de Oliveira)

quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

O quarto rei mago




Conta uma velha lenda que quando os três reis Magos – Gaspar, Melquior e Baltazar – se dirigiram à Belém e chegaram ao estábulo onde nascera o menino-Deus, depositaram seus presentes: ouro, incenso e mirra, diante do menino e de sua mãe, mas a criança não sorriu – ele não percebeu o esplendor do ouro e nem sentiu o cheiro da mirra e quando Maria ascendeu o incenso, a fumaça fez o neném tossir.

Os três Magos, depois de reverenciarem o pequenino, se despediram meio desapontados.

Assim que seus camelos desapareceram atrás das montanhas, chegou à Belém, um quarto rei Mago.

Sua pátria era um país banhado pelo Golfo Pérsico. Quando ele viu a estrela que anunciava o nascimento do Deus que viria redimir a humanidade, sentiu que tinha de procurar o lugar sobre o qual ela brilhava. Aprontou-se para ir reverenciar o menino-Deus e levou para presenteá-lo o que tinha de mais precioso: três grandes pérolas brancas, maiores que um ovo de pomba. Viajou muitos dias e ficou sabendo dos outros três reis e de seus presentes. Mas ...suas mãos estavam vazias quando descobriu o lugar anunciado pela estrela – ele não tinha mais as pérolas!...

Ao chegar ao estábulo, abriu as portas com cuidado e viu o menino Jesus sobre os joelhos de sua mãe. Ela o embalava suavemente cantando uma cantiga de ninar.

Lentamente o Rei entrou e se atirou aos pés do Menino e de sua mãe e, hesitante começou a falar:

“Menino-Santo, eu vim lhe render homenagens e estou sabendo que aqui já estiveram três reis trazendo-Lhe ricas oferendas. Eu também tinha um presente para lhe dar: três pérolas preciosas, mas... não as tenho mais! Acontece que eu tive de pernoitar em uma hospedaria de beira de estrada e ali encontrei um velho tremendo de febre, estendido sobre um banco. Ninguém sabia quem era e ele não trazia dinheiro algum, com toda certeza morreria abandonado. Eu tive pena dele, peguei uma das pérolas e dei ao hospedeiro para providenciar um médico e, se o velho morresse, que tivesse garantido um túmulo em terra abençoada.

Na manhã seguinte, eu parti. A estrada seguia por um vale deserto, cheio de enormes rochedos. Subitamente eu ouvi gritos vindos de um bosque. Procurei ver o que estava acontecendo e deparei-me com soldados subjugando uma jovem mulher e se preparando para serviciá-la. Eram muitos e eu não teria condições de lutar contra eles. Oh! Divina-criança, perdoa-me mais uma vez pois eu peguei outra pérola e paguei a liberdade daquela jovem. Ela me agradeceu e fugiu para as montanhas.

Eu agora só tinha uma pérola, mas ao menos uma eu queria lhe trazer!

Já estava bem próximo de Belém, mas ao passar por uma pequena vila, ouvi muito choro e gritos – eram mães de pequeninos que tinham sido mortos por soldados em obediência às ordens de Herodes”: “matem todos os meninos de até dois anos!! Eu vi um soldado pronto a cortar a cabeça de um menininho que chorava muito, sua mãe gritava dolorosamente – ah! Menino-Deus, perdoa-me, mas eu peguei a terceira pérola e a dei ao soldado para que ele devolvesse a criança à mãe.

Ah! meu Santinho! É por isso que venho de mãos vazias. Perdão! Perdão!

O silêncio reinava no estábulo quando o rei concluiu sua confissão. Durante alguns instantes ele permaneceu inclinado, com a testa no chão e finalmente quando levantou os olhos viu S.José se aproximando e Maria olhando o filho que parecia dormir.

Não! O menino Jesus não dormia. Lentamente ele se virou estendendo suas mãozinhas pra as mãos vazias do rei... e o menino Jesus sorria.



Fonte: Joannes Joersen - Os Mais belos Contos de Natal - Editora Vozes. Adaptado por Daura Guimarães.

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Menina Bonita do Laço de Fita


Era uma vez uma menina linda, linda.

Os olhos pareciam duas azeitonas pretas brilhantes, os cabelos enroladinhos e bem negros.

A pele era escura e lustrosa, que nem o pelo da pantera negra na chuva.

Ainda por cima, a mãe gostava de fazer trancinhas no cabelo dela e enfeitar com laços de fita coloridas. Ela ficava parecendo uma princesa das terras da áfrica, ou uma fada do Reino do Luar.

E, havia um coelho bem branquinho, com olhos vermelhos e focinho nervoso sempre tremelicando. O coelho achava a menina a pessoa mais linda que ele tinha visto na vida.

E pensava:

- Ah, quando eu casar quero ter uma filha pretinha e linda que nem ela...

Por isso, um dia ele foi até a casa da menina e perguntou:

- Menina bonita do laço de fita, qual é o teu segredo para ser tão pretinha?

A menina não sabia, mas inventou:­

- Ah deve ser porque eu caí na tinta preta quando era pequenina...

O coelho saiu dali, procurou uma lata de tinta preta e tomou banho nela. Ficou bem negro, todo contente. Mas aí veio uma chuva e lavou todo aquele pretume, ele ficou branco outra vez.

Então ele voltou lá na casa da menina e perguntou outra vez:

- Menina bonita do laço de fita, qual é o seu segredo para ser tão pretinha?

A menina não sabia, mas inventou:
- Ah, deve ser porque eu tomei muito café quando era pequenina.

O coelho saiu dali e tomou tanto café que perdeu o sono e passou a noite toda fazendo xixi.

Mas não ficou nada preto.

- Menina bonita do laço de fita, qual o teu segredo para ser tão pretinha?

A menina não sabia, mas inventou:

­- Ah, deve ser porque eu comi muita jabuticaba quando era pequenina.

O coelho saiu dali e se empanturrou de jabuticaba até ficar pesadão, sem conseguir sair do lugar. O máximo que conseguiu foi fazer muito cocozinho preto e redondo feito jabuticaba. Mas não ficou nada preto.

Então ele voltou lá na casa da menina e perguntou outra vez:
- Menina bonita do laço de fita, qual é teu segredo pra ser tão pretinha?

A menina não sabia e... Já ia inventando outra coisa, uma história de feijoada, quando a mãe dela que era uma mulata linda e risonha, resolveu se meter e disse:

- Artes de uma avó preta que ela tinha...

Aí o coelho, que era bobinho, mas nem tanto, viu que a mãe da menina devia estar mesmo dizendo a verdade, porque a gente se parece sempre é com os pais, os tios, os avós e até com os parentes tortos.

E se ele queria ter uma filha pretinha e linda que nem a menina, tinha era que procurar uma coelha preta para casar.

Não precisou procurar muito. Logo encontrou uma coelhinha escura como a noite, que achava aquele coelho branco uma graça.

Foram namorando, casando e tiveram uma ninhada de filhotes, que coelho quando desanda a ter filhote não para mais! Tinha coelhos de todas as cores: branco, branco malhado de preto, preto malhado de branco e até uma coelha bem pretinha. Já se sabe, afilhada da tal menina bonita que morava na casa ao lado.

E quando a coelhinha saía de laço colorido no pescoço sempre encontrava alguém que perguntava:

- Coelha bonita do laço de fita, qual é o teu segredo para ser tão pretinha?

E ela respondia:

- Conselhos da mãe da minha madrinha...

[de Ana Maria Machado, livro.ilustração: Claudius]

(Enviada a pedidos, por Amauri de Oliveira)

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

A Vaquinha


Um Mestre da sabedoria passeava por uma floresta com seu fiel discípulo quando avistou ao longe um sítio de aparência pobre e resolveu fazer uma breve visita...

Durante o percurso ele falou ao aprendiz sobre a importância das visitas e as oportunidades de aprendizado que temos, também com as pessoas que mal conhecemos.

Chegando ao sitio constatou a pobreza do lugar, sem calçamento, casa de madeira, os moradores, um casal e três filhos, vestidos com roupas rasgadas e sujas... então se aproximou do senhor aparentemente o pai daquela família e perguntou:

- Neste lugar não há sinais de pontos de comércio e de trabalho; como o senhor e a sua família sobrevivem aqui?

E o senhor calmamente respondeu:

- Meu amigo, nos temos uma vaquinha que nos da vários litros de leite todos os dias. Uma parte desse produto nos vendemos ou trocamos na cidade vizinha por outros gêneros de alimentos e a outra parte nos produzimos queijo, coalhada, etc...; para o nosso consumo e assim vamos sobrevivendo.

O sábio agradeceu a informação, contemplou o lugar por uns momentos, depois se despediu e foi embora. No meio do caminho, voltou ao seu fiel discípulo e ordenou:

- Aprendiz, pegue a vaquinha, leve-a ao precipício ali na frente e empurre-a, jogue-a lá em baixo.

O jovem arregalou os olhos espantado e questionou o mestre sobre o fato da vaquinha ser o único meio de sobrevivência daquela família, mas, como percebeu o silêncio absoluto do seu mestre, foi cumprir a ordem.

Assim empurrou a vaquinha morro abaixo e a viu morrer.

Aquela cena ficou marcada na memória daquele jovem durante alguns anos e um belo dia ele resolveu largar tudo o que havia aprendido e voltar naquele mesmo lugar e contar tudo aquela família, pedir perdão e ajuda-los.

Assim fez, e quando se aproximava do local avistou um sitio muito bonito, com arvores floridas, todo murado, com carro na garagem e algumas crianças brincando no jardim. Ficou triste e desesperado imaginando que aquela humilde família tivera que vender o sitio para sobreviver, "apertou" o passo e chegando lá, logo foi recebido por um caseiro muito simpático e perguntou sobre a família que ali morava há uns quatro anos e o caseiro respondeu:

- Continuam morando aqui.

Espantado ele entrou correndo na casa; e viu que era mesmo a família que visitara antes com o mestre. Elogiou o local e perguntou ao senhor (o dono da vaquinha):

- Como o senhor melhorou este sítio e esta muito bem de vida???
E o senhor entusiasmado, respondeu:

- Nos tínhamos uma vaquinha que caiu no precipício e morreu, dai em diante tivemos que fazer outras coisas e desenvolver habilidades que nem sabíamos que tínhamos, assim alcançamos o sucesso que seus olhos vislumbram agora...

(História enviada por Amauri de Oliveira)

A MORTE QUE FEZ UM HOMEM RICO


Um homem tinha muitos filhos, e já todos os homens da freguesia eram seus compadres.
A mulher alcançou outra vez e pronta estava para parir. O homem, que não queria pedir a mais ninguém, abalou de casa.
Encontrou no caminho um homem muito desfigurado, que lhe perguntou aonde ele ia.
Ele contou-lhe, e o homem disse-lhe que voltasse para trás, que ele era o seu padrinho.
Assim foi.
Quando acabou o batizada, o homem disse:
— Compadre, repare bem para mim, para me conhecer onde quer que me encontre. Eu sou a Morte. Tu muda de casa e faz-te médico, que hás-de ganhar muito dinheiro. Em tu me vendo aos pés da cama de qualquer doente, é porque ele escapa. Em tu me vendo à cabeceira, é porque ele morre.
O homem assim fez; começou a ter muita fama e ganhava muito dinheiro e já estava muito rico mais os filhos.
Num dia a Morte chegou-se ao pé dele e disse-lhe:
— Bem, agora já te fiz rico, mas hoje chegou a tua vez e venho matar-te.
O homem pediu muito que o deixasse viver mais um ano.
A Morte consentiu.
O homem então mandou fazer uma torre de bronze, com as paredes muito grossas, para a Morte lá não entrar.
Quando o ano estava quase a acabar, ele mandou fazer um anel de ouro, meteu-o no dedo e fechou-se na torre.
Estava lá a jantar, e apareceu-lhe a Morte ao pé dele.
Ele, muito assustado, perguntou-lhe:
— Ó comadre Morte, tu por onde é que entraste?
A Morte disse que pelo buraco da fechadura.
Ele então lhe disse:
— Já que tu te meteste pelo buraco da fechadura, hás-de meter-se pelo buraco desta cabaça.
A Morte meteu-se e ele tapou a cabaça com uma rolha e disse à Morte:
— Agora sai daí para fora se és capaz.
A Morte disse-lhe:
— Ó compadre, pois eu fiz-te tanto benefício, e tu agora me queres aqui deixar dentro desta cabaça? Tira-me a rolha, que eu não te faço mal.
O homem tomou a perguntar-lhe se ela não lhe fazia mal.
A Morte disse que não.
Ele destapou a cabaça e, ao tempo que destapou, caiu, mas não morto, e a Morte roubou-lhe o anel.
Ele disse:
— Ó comadre, então tu prometeste-me que não me matavas, e agora me queres matar. Deixa-me ao menos rezar um Padre-Nosso e uma Ave-Maria pela minha alma.
A Morte consentiu.
Ele que fez?
Começou a rezar o Padre-Nosso até ao meio e depois tornava a começar.
De modo que a Morte não o podia matar.
O homem então saiu da torre e começou outra vez na sua vida.
Um dia andava ele à caça e a Morte fingiu-se de morta no meio do monte.
O homem chegou e, julgando que era um homem morto, disse:
— Ah! Pobre homem, quem te matou? Deixa-me ao menos rezar um Padre-Nosso e uma Ave Maria pela tua alma.
Rezou, mas ao tempo que acabou, a Morte levantou-se e matou-o.

Consiglieri Pedroso, in Contos Populares Portugueses
(Enviado por Amauri de Oliveira)