domingo, 27 de fevereiro de 2022

“Os duendes” (Irmãos Grimm)


 


Um sapateiro tinha ficado muito pobre, sem que lhe coubesse a culpa. E, por fim, só lhe restava um pedaço de couro, para um único par de sapatos. Cortou-o à  noite, a fim de aprontá-lo na manhã seguinte e, como tinha a consciência tranquila,  deitou-se calmamente, fez as suas orações e adormeceu. No outro dia, depois da prece  matinal, quando ia sentar-se para iniciar o trabalho, viu os sapatos, prontinhos, em  cima da mesa. Ficou assombrado, sem encontrar explicação para aquilo. Tomou-os nas mãos e examinou-os cuidadosamente. Haviam sido feitos com tal capricho, sem  nenhum ponto errado, que pareciam uma verdadeira obra de arte.

Logo depois entrou um freguês e, como os sapatos lhe agradassem muito,  pagou mais por eles. Com esse dinheiro, o sapateiro pode comprar couro para dois  pares. Cortou-os à noite, disposto a trabalhar neles no dia seguinte. Mas não foi  preciso: ao levantar-se, lá estavam eles, prontinhos da silva. E também não faltaram os  compradores, que lhe deram dinheiro suficiente para que adquirisse couro para quatro  pares. Também a esses ele encontrou terminados no outro dia.

E assim continuou acontecendo. O calçado que cortava à noite, encontrava concluído na manhã seguinte.

Começou a ter boa renda e, por fim, tornou-se um homem rico.

Certa noite, pouco antes do Natal, o sapateiro, que já havia cortado o couro  para o próximo dia, antes de deitar-se, disse à mulher:

 - Que tal se esta noite ficássemos acordados para ver quem nos presta tão  grande auxílio?

A mulher concordou e foi acender uma vela. Depois o casal escondeu-se num  canto da sala, atrás de umas roupas ali penduradas.

Ao soar a meia-noite, apareceram dois ágeis e graciosos homenzinhos, muito   pequeninos e sem roupa alguma, que se sentaram à mesa do sapateiro. Apanharam  todo o couro cortado e, com seus dedinhos, se puseram a costurar, bater e puxar o fio  com tanta ligeireza que o sapateiro, assombrado, mal podia acreditar nos seus olhos.

Não cessaram até que tudo estivesse pronto e depois desapareceram rapidamente

No dia seguinte, a mulher disse:

 - Os anõezinhos nos tornaram ricos e devemos mostrar-lhes a nossa gratidão.  Com certeza sentem muito frio, andando assim nuzinhos, sem nada em cima do corpo.  Sabes de uma coisa? Farei para cada um deles uma camisinha, um casaco, colete e calça, e um par de meias de tricô. Tu poderás fazer-lhes uns sapatos.

Ao que lhe respondeu o homem:

 - Parece-me boa ideia!

E, à noite, em vez de couro cortado, puseram os presentes sobre a mesa  depois esconderam-se para ver o que fariam os homenzinhos.

À meia-noite chegaram eles, saltitando, e logo se dispuseram a começar o  trabalho. Quando, porém, em vez de couro cortado, encontraram as graciosas peças  de roupa, ficaram no princípio admirados, mas logo mostraram imensa alegria.

Vestiram-se com incrível rapidez e, alisando as roupas no corpo, puseram-se a cantar:

“Não somos rapazes bonitos e elegantes?

Por que continuarmos sapateiros como antes?”

Depois saltaram e dançaram, brincando em cima de cadeiras e bancos. Por fim, saíram dançando porta fora. Desse dia em diante, nunca mais apareceram. Mas o  sapateiro viveu bem pelo resto de sua vida e sempre teve sorte em todos os negócios  que fez.


sexta-feira, 25 de fevereiro de 2022

Cuca

 



Vai-te, coca, sai daqui
Para cima do telhado
Deixa o menino
Dormir sossegado

Nana, neném
Que a cuca vem pegar
Papai tá na roça
Mamãe foi cozinhar

A cuca é um papão, um ente fantástico que mete medo às crianças causando pavor. Sua aparência varia de lugar para lugar, mas a maioria das pessoas diz que ela tem a forma de uma velha, bem velha e enrugada, corcunda,  cabeleira branca, toda desgrenhada, com aspecto assustador. Ela só aparece à noite, sempre procurando por aquelas crianças que fazem pirraça e não querem ir dormir cedo. Então, a cuca as coloca num saco, levando-as embora para não se sabe onde e faz com elas não se sabe bem o que, mas, com toda certeza, trata-se de algo muito terrível.

Ela também é chamada de coca ou coco e assombra crianças de Portugal, Espanha, alguns países africanos e tribos indígenas brasileiras. Em alguns lugares ela é um velho, em outros, se parece com um jacaré ou uma coruja.

Existem muitas canções e versos sobre a cuca. Luís da Câmara Cascudo, em Geografia dos mitos do Brasil, indica a seguinte cantiga, comum no Nordeste brasileira:

Dorme, neném
Se não a cuca vem
Papai foi pra roça
Mamãe logo vem

 

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2022

ERA UMA VEZ O ESPANTALHO

 


Não era muito bonito, pois, como todos os espantalhos, foi feito para espantar pássaros e outros bichos que aparecem nas roças de milho, trigo e outras plantações… Mas esse Espantalho especial era muito especial mesmo.

Ele não queria assustar ninguém. Ele queria mesmo é fazer amigos. Muitos amigos.
Então tentou colocar um sorriso estampado na cara, para se mostrar amigável, mas os pássaros, muito ariscos, não acreditaram e nem se aproximaram, mas o nosso Espantalho especial não desistiu, e continuou com o sorriso.

Muito tempo se passou e certo dia, algumas borboletas batiam as asas por aquele milharal, quando perceberam o sorriso estampado na cara.
Ficaram muito curiosas.

Imaginem só!

Onde já se viu um Espantalho com tamanho sorriso estampado na cara?
Aproximaram-se, o Espantalho abriu ainda mais o sorrisão e elas quiseram saber o porquê de tal sorriso e o Espantalho respondeu: - Ah! É que eu quero muito, muito mesmo, ter um montão de amigos, mas todo mundo se assusta quando me vê!
- Mas com esse sorrisão todo… Tenho certeza que logo, logo vai estar cercado por um montão de amigos.

Não deu outra. Nosso Espantalho continuou com aquele sorriso estampado na cara e logo estava mesmo por um montão de amigos. O Espantalho ficou muito feliz.
Quem não ficou nada feliz foi o dono do milharal.

Ah! Ele ficou muito zangado quando viu aquele bando de pássaros, toupeiras e outros bichos, brincando e devorando seus milhos.

De tão zangado, arrancou o Espantalho do pau onde ficava preso e o deixou caído no meio da plantação. Logo veio uma chuva forte e os bichos correram para se abrigar, mas o pobre Espantalho não podia correr, não podia se voar e nem mesmo se arrastar. Foi aí que todos os bichos se juntaram e foram buscar o novo amigo para se abrigar com eles e desde então, nunca se sabe onde o nosso Espantalho pode estar, pois os bichos gostaram tanto dele e ele dos bichos, que agora ele vive assim…


Hora voando com os pássaros, hora debaixo da terra com as toupeiras e onde mais seus amigos bichos puderem leva-lo, transformando-o no Espantalho mais alegre, e sorridente, de todo o mundo.

MARIA HELENA CRUZ

terça-feira, 22 de fevereiro de 2022

O Tesouro de Bresa

 



                       (com base nas pp. 43/49 do livro Os Melhores Contos, de Malba Tahan)

 

Houve outrora, na Babilônia, um pobre e modesto alfaiate chamado Enedim, homem inteligente e trabalhador, que não perdia a esperança de vir a ser riquíssimo.

 

Como e onde, no entanto, encontrar um tesouro fabuloso e tornar-se, assim, rico e poderoso?

Um dia, parou na porta de sua humilde casa, um velho mercador da fenícia, que vendia uma infinidade de objetos extravagantes.

 

Por curiosidade, Enedim começou a examinar as bugigangas oferecidas, quando descobriu, entre elas, uma espécie de livro de muitas folhas, onde se viam caracteres estranhos e desconhecidos.

 

Era uma preciosidade aquele livro, afirmava o mercador, e custava apenas três dinares.

 

Era muito dinheiro para o pobre alfaiate, razão pela qual o mercador concordou em vender- lhe o livro por apenas dois dinares.

 

Logo que ficou sozinho, Enedim tratou de examinar, sem demora, o bem que havia adquirido.

 

Qual não foi sua surpresa quando conseguiu decifrar, na primeira página, a seguinte legenda: "o segredo do tesouro de Bresa."

 

Que tesouro seria esse

 

Enedim recordava vagamente de já ter ouvido qualquer referência a ele, mas não se lembrava onde, nem quando.

 

Mais adiante decifrou: "o tesouro de Bresa, enterrado pelo gênio do

mesmo nome entre as montanhas do Harbatol, foi ali esquecido, e ali se acha ainda, até que algum homem esforçado venha encontrá-lo."

 

Muito interessado, o esforçado tecelão dispôs-se a decifrar todas as páginas daquele livro, para apoderar-se de tão fabuloso tesouro.

 

Mas, as primeiras páginas eram escritas em caracteres de vários povos, o que fez com que Enedim estudasse os hieróglifos egípcios, a língua dos gregos, os dialetos persas e o idioma dos judeus.

 

Em função disso, ao final de três anos Enedim deixava a profissão de alfaiate e passava a ser o intérprete do rei, pois não havia na região ninguém que soubesse tantos idiomas estrangeiros.

 

Passou a ganhar muito mais e a viver em uma confortável casa.

 

Continuando a ler o livro encontrou várias páginas cheias de cálculos, números e figuras.

 

Para entender o que lia, estudou matemática com os calculistas da cidade e, em pouco tempo, tornou-se grande conhecedor das transformações aritméticas.

 

Graças aos novos conhecimentos, calculou, desenhou e construiu uma grande ponte sobre o rio Eufrates, o que fez com que o rei o nomeasse prefeito.

 

Ainda por força da leitura do livro, Enedim estudou profundamente as leis e princípios religiosos de seu país, sendo nomeado primeiro-ministro daquele reino, em decorrência de seu vasto conhecimento.

 

Passou a viver em suntuoso palácio e recebia visitas dos príncipes mais ricos e poderosos do mundo.

 

Graças a seu trabalho e ao seu conhecimento, o reino progrediu rapidamente, trazendo riquezas e alegria para todo seu povo.

 

No entanto, ainda não conhecia o segredo de Bresa, apesar de ter lido e relido todas as páginas do livro.

 

Certa vez, teve a oportunidade de questionar um venerando sacerdote a respeito daquele mistério, que sorrindo esclareceu:

 

"O tesouro de Bresa já está em seu poder, pois graças ao livro você adquiriu grande saber, que lhe proporcionou os invejáveis bens que possui. Afinal, Bresa significa saber e Harbatol quer dizer trabalho."

 

Com estudo e trabalho pode o homem conquistar tesouros inimagináveis.

 

O tesouro de Bresa é o saber, que qualquer homem esforçado pode alcançar, por meio dos bons livros, que possibilitam "tesouros encantados" àqueles que se dedicam aos estudos com amor e tenacidade.

domingo, 20 de fevereiro de 2022

Jonas e a baleia

 


Uma menina estava conversando com a sua professora. 

A professora disse que era fisicamente impossível que uma baleia engula um ser humano porque apesar de ser um mamífero muito grande, a sua garganta é muito pequena. 

A menina afirmou que Jonas foi engolido por uma baleia.

 Irritada, a professora repetiu que uma baleia não poderia engolir nenhum ser humano; era fisicamente impossível. 

A menina, então disse: - 'Quando eu morrer e for ao céu, vou perguntar a Jonas'. 

A professora lhe perguntou:- 'E o que vai acontecer se Jonas tiver ido ao inferno? 

'A menina respondeu: - 'Aí a senhora pergunta.'


Revista 'Pais e Filhos',  Pedro Bloch

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2022

Caveira

 


Ary Lobo

 

Caveira quem te matou

Olha foi a língua meu senhor

 

Eu bem que te dizia

Que deixasse a vida alheia

Que a justiça divina vê tudo e não se encandeia

Quem faz mal ao seu vizinho

Seu mal já vem no caminho

 

Você hoje esta penando

Por ser falso e ser ruim

Quando eu te avisava você se virava contra mim

Eu bem que te dizia

Inveja matou Caim

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2022

A fábula do tigre

 

                           


                  Relatada por Zimmer em Filosofias da Índia, a partir de The Gospel of Sri Ramakrishna

Um filhote de tigre fora criado entre cabras. Prenhe e balofa, sua mãe passara vários dias à procura de uma presa sem nada conseguir, até que deparou com um rebanho de cabras  selvagens. Estava faminta, o que explica a violência de sua investida. O esforço do ataque precipitou o parto e ela acabou morrendo de esgotamento. As cabras, que haviam se dispersado, retornaram ao lugar e lá encontraram um filhote de tigre choramingando ao lado de sua mãe. Levadas pela compaixão maternal adotaram a débil criatura; amamentaram-na junto com suas próprias crias e dela cuidaram ternamente. O animal cresceu e sobreveio a recompensa pelos cuidados dispensados, pois o pequeno companheiro aprendeu a linguagem das cabras, adaptou sua voz àquele som suave e mostrou tanto afeto quanto qualquer cabrito. A princípio teve alguma dificuldade para mastigar com seus dentes pontiagudos as tenras folhas do pasto, mas logo se acostumou. A dieta vegetariana o mantinha enfraquecido, conferindo ao seu temperamento uma notável doçura.

Certa noite - quando o órfão, crescido entre as cabras, já havia alcançado a idade da razão - o rebanho foi atacado, desta vez por um velho e feroz tigre. As cabras se dispersaram, porém o jovem permaneceu onde estava, sem medo ainda que surpreso. Achando-se face a face com a terrível criatura da selva, fitou-o estupefato. Passado o primeiro impacto, começa a tomar consciência de si. Desamparado, berra, arranca folhas de pasto e se põe a mastigar, ante o olhar perplexo do outro.

De repente, o poderoso intruso pergunta:
_ Que fazes aqui entre as cabras?! Que estás mastigando?!
A resposta foi um berro. O outro, indignado, disse num rugido:
_ Por que emites este som estúpido?!
E antes que o pequeno pudesse responder, apanhou-o pelo cangote e o sacudiu como se quisesse fazê-lo recobrar a lucidez. O tigre da selva carregou o assustado animal até um lago próximo, soltando-o na margem e obrigando-o a olhar para a superfície espelhada da água, então iluminada pela lua.
_ Vê estas duas imagens! Não são semelhantes? Tens a cara típica de um tigre, é como a minha. Por que te iludes pensando seres um cabrito? Por que berras? Por que mastigas pasto?!

O tigrezinho, incapaz de responder, continuava a olhar espantado comparando as duas imagens refletidas. Inquieto, apoiu-se numa e logo noutra pata, e lançou um grito de aflitiva incerteza. A velha fera novamente o carregou porém agora até seu covil, onde lhe ofereceu um pedaço de carne crua e sangrenta, sobra de uma refeição anterior. Ante a inusitada visão, o jovem tremeu de repugnância mas o velho, ignorando o fraco gesto de protesto, ordenou rudemente:
_ Come! Engole!

O outro resistiu, porém a horripilante carne foi forçada a passar entre seus dentes; o tigre vigiava atentamente seu aprendiz que tentava mastigar e preparava-se para engolir. Sua não-familiaridade com a consistência da carne causava-lhe certa dificuldade, e estava prestes a emitir outro débil berro quando começou a experimentar o gosto do sangue. Excitado, devorou o restante com avidez, sentindo um prazer incomum à medida que o novo alimento descia-lhe pela garganta e atingia o estômago. Uma força estranha e quente irradiava de suas entranhas trazendo-lhe uma sensação eufórica e embriagadora. Estalou a língua, lambeu o focinho satisfeito e, erguendo-se, deu um largo bocejo como se estivesse despertando de uma longa noite de sono - uma noite que o manteve sob feitiço por anos e anos. Espreguiçando-se, arqueou as costas, estendeu e abriu as garras. Sua cauda fustigava o solo e, de súbito, irrompeu de sua garganta o triunfal e aterrorizante rugido de um tigre.

O inflexível mestre, que estivera observando de perto, sentia-se recompensado. A transformação, de fato, acontecera. Ao cessar o rugido, perguntou severamente:
_ Agora sabes quem realmente és?
E para completar a iniciação de seu jovem discípulo no saber secreto de sua própria e verdadeira natureza, acrescentou:
_ Vem! Vamos caçar juntos pela selva.

Topo

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2022

O REI QUE ERA DONO DO MUNDO

 



 
Alberto Filho 

 Era uma vez um Rei muito rico. Ele era tão rico que suas riquezas eram impossíveis de contar. Mesmo assim ele não estava satisfeito, e queria sempre mais e mais. Por isso ele não se importava com nenhuma outra coisa.

Um dia, ele subiu na mais alta torre do seu castelo, olhou para suas terras sem fim, e disse:

- Tenho muito pouco, preciso conseguir mais. Na verdade acho que preciso de todas as terras e riquezas do Mundo.

Então ele convocou seus exércitos que eram muitos, e lhes ordenou que conquistassem todas as Nações do Mundo, e lhe trouxesse todas as Riquezas existentes.

Assim seu exército partiu para cumprir sua missão. Depois de feito isso, ele disse:

- Agora sim, tenho tudo no Mundo. Na verdade eu tenho o próprio Mundo e também todas as suas riquezas. Nada mais me falta, não preciso de mais nada! E ele se cobriu com seus tesouros. Estava tão contente que dormiu ali mesmo. Então um dia ele viu que não estava mais contente e pensou:

- Eu já tenho todas as riquezas e terras do Mundo, todas as pessoas são meus servos, e ainda assim sinto que me falta mais alguma coisa! Assim ele mandou chamar seus sábios para que descobrissem o que ainda lhe faltava. E eles disseram:

- A coisa mais importante do Mundo é a mais difícil de se conseguir. Não pode ser conseguida com Dinheiro ou Poder. Na verdade o Senhor já possui essa coisa, e Ela lhe foi dada de graça. Mesmo assim ela não pode ser vista ou tocada, e só pode ser vista quando a pessoa perde.

Depois de ouvir isso, o Rei ficou pensativo e sem entender o que os Sábios queriam dizer com aquilo, afirmou:

- É claro que esta Coisa não existe. Qualquer coisa que eu conheço pode ser comprada com meu Dinheiro ou Conquistada por meus Exércitos. Apesar de ganancioso, o Rei era um bom governante para o seu Povo.

Assim, cismado com as palavras dos Sábios, resolveu por um tempo, desistir de querer saber o que faltava conquistar.

Então um dia o Rei amanheceu com febre. Estava doente. Assim, ele mandou chamar os melhores Médicos e Magos do Mundo para cuidar de sua doença. Mas o tempo passava e Ele não melhorava. Então mandou chamar os Sábios para ouvir seus conselhos. E os Sábios disseram:

- Isto Majestade, era a coisa da qual lhe falamos naquele dia. Nós a temos desde o nascimento, e não pode ser vista até o momento que deixa de existir. Essa coisa é nossa SAÚDE. Poucos lhe dão importância, mas, é a coisa mais importante do Mundo, e é IMPOSSÍVEL de se comprar.

Então o Rei compreendeu tudo, e disse:

- Eu com todo o Poder e Riquezas do Mundo não fui capaz de conseguir algo tão simples, que era minha Saúde. Eu fui um TOLO. De que adiantou tanto poder e riquezas se não fui capaz de conquistar algo que me foi dado de Graça.

E o Rei finalmente ficou curado. Então ele disse:

- Agora sei o que é ficar doente. De hoje em diante, meu povo terá os melhores Hospitais, e médicos, e Escolas. Minhas terras e riquezas serão de todos. E ele foi contar a boa nova ao seu Povo. Então ele subiu na torre mais alta do seu Castelo e olhando de cima pensou:

- Como é bonito a paisagem daqui de cima. Eu já subi muitas vezes aqui e nunca tinha visto que era assim. E pensar que esta beleza sempre existiu. O olhar de felicidade vê coisas maravilhosas. Ter saúde é de fato uma benção.

terça-feira, 15 de fevereiro de 2022

A ESFINGE

 


A esfinge é uma figura da mitologia egípcia simbolizada por um monstro com cabeça humana e corpo de leão, com asas de pássaro ou cauda de serpente. Dentre todas as estátuas de esfinges do Egito, a mais famosa é a grande esfinge de Giza (ou Gizé), esculpida em rocha natural, e que servia de guardiã da tumba do faraó Quéfren. Para proteger a pirâmide dos demônios, o faraó mandou construir uma grande esfinge, representando o deus do Sol, levante, Harmáquis, que segundo a tradição, tinha forma de leão com a cabeça humana. A grande esfinge de Giza data de aproximadamente 2.300 a.C e possui 60 metros de comprimento por 20 de altura. Entre suas patas dianteiras se localiza um pequeno templo.

Do Egito, a esfinge passou à mitologia grega. Era também uma figura monstruosa, um leão de asas com cabeça de mulher, que vivia num rochedo perto de Tebas. 

Segundo conta a lenda, a deusa Juno, indignada com Tebas, porque a jovem tebana Alcmena aceitara os galanteios de Júpiter, mandou o monstro para cima do monte Citeron. A todos que passavam por ali a esfinge propunha um enigma, ameaçando: "Decifra-me ou devoro-te". 

O enigma consistia em responder qual era o animal que tinha quatro pés pela manhã, dois ao meio-dia e três à tarde. A resposta parece difícil, mas fica evidente em seu sentido figurado. A resposta correta é o homem: pela manhã, ou quando bebê, ele engatinha; ao meio-dia, já crescido, ele caminha ereto; e à tarde, quando velho, anda cansado apoiado a uma bengala. 

A lenda ainda conta que apenas Édipo conseguiu acertar a resposta, e a esfinge, de tanta raiva, saltou do rochedo e morreu.

 


segunda-feira, 14 de fevereiro de 2022

A história da galinha que subiu até o céu

 


(conto de Tarak Hammam, baseado em conto popular africano)

Tradução: Tapetes Contadores de Histórias

 Era uma vez, uma galinha e seu pintinho. Numa certa manhã, a galinha se afastou de sua casa para procurar sementes, seguida por seu pintinho. Eles encontraram uma velha árvore. O pintinho brincava ao pé da velha árvore enquanto sua mãe ciscava sementes pelo caminho.  De repente, um buraco na árvore atraiu o pequeno pintinho. Ele colocou sua cabeça dentro do buraco, depois o pescoço, em seguida as asas, depois o rabo e ... TCHLOULSSZ! O buraco se fechou.  A árvore tinha engolido o pintinho.

- Coot, cot, coot! - suplicou a galinha – Ó, Velha Árvore, por favor, devolva o meu filhote!

 A velha árvore respondeu:

- Traga-me uma cabaça cheia de leite de girafa e eu o devolverei!

 A mamãe galinha não se desencorajou e foi à procura da girafa.

- Por favor, ó Girafa, me dê de seu leite para que a velha árvore que engoliu o meu pintinho devolva o meu filhote!

 A girafa respondeu:

- Peça a árvore da selva para me dar de suas folhas e eu lhe darei do meu leite!

 A galinha então foi à procura da árvore da selva.

- Por favor, ó Árvore da Selva, me dê de suas folhas para que a girafa dê de seu leite, para que a velha árvore que engoliu o meu pintinho devolva o meu filhote!

A árvore da selva respondeu:

- Peça à chuva para cair e eu darei de minhas folhas!

A galinha voou até encontrar a chuva.

- Por favor, ó Chuva, caia sobre a árvore da selva para que ela dê de suas folhas, para que a girafa dê de seu leite, para que a velha árvore que engoliu o meu pintinho devolva o meu filhote!

A chuva respondeu:

- Peça ao céu para mandar suas nuvens e eu cairei sobre a árvore da selva!

A galinha subiu, subiu, voou muito alto até encontrar o céu.

- Por favor, ó Céu, mande suas nuvens para que a chuva caia sobre a árvore da selva, para que ela dê de suas folhas, para que a girafa dê de seu leite, para que a velha árvore que engoliu o meu pintinho devolva o meu filhote!

O céu respondeu:

- Peça ao vento para soprar e eu mandarei as nuvens até a chuva!

A galinha chegou, enfim, até o vento.

- Por favor, ó Vento, sopre o céu para que ele mande suas nuvens até a chuva, para que a chuva caia sobre a árvore da selva, para que ela dê de suas folhas para a girafa, para que a girafa dê de seu leite, para que a velha árvore que engoliu o meu pintinho devolva o meu filhote!

 O vento respondeu:

- Me dê o vento que sai de suas asas e eu lhe ajudarei!

- Está bem! - disse a galinha.

O vento recebeu o vento que saía das asas da galinha e então soprou o céu.  O céu mandou suas nuvens para a chuva. A chuva caiu sobre a árvore da selva. A árvore da selva deu de suas folhas para a girafa que deixou uma cabaça cheia de leite à margem do caminho.

A galinha despencou do céu, caindo como uma pedra. Cambaleando, ela pegou a cabaça cheia de leite de girafa e foi até a velha árvore.

- Aqui está o leite de girafa! Devolva o meu pintinho.

- Muito bem! - disse a velha árvore.

A galinha recuperou o seu filhote e voltou bem rápido para casa.

A partir deste dia, as galinhas não voaram mais, pois não há mais vento em suas asas.

 

sábado, 12 de fevereiro de 2022

O SOLDADO E O DIABO

 

Contam que, em outros tempos, há milhares e milhares de anos, quando nada  existia do que hoje existe, viveu em certa cidade um rico fidalgo, o barão de Macário,  tão poderoso e opulento, quão orgulhoso e mau.

Uma tarde, achava-se ele no seu escritório, contemplando avaramente a grande fortuna que acumulara, roubando aos pobres, às viúvas e aos órfãos, emprestando dinheiro a juros elevados, quando, de súbito, se sentiu tocado por um raio de bondade,  até então jamais experimentado pelo seu coração empedernido.

Lembrou-se que já estava velho; e que, com aquela idade, nunca fizera o menor benefício a pessoa alguma, sem ter dado jamais uma única esmola sequer. Arrependeu[1]se, então, do seu passado.

Nessa mesma tarde, Augusto, um infeliz sapateiro, seu vizinho, que vivia na maior pobreza, carregado de filhos, veio bater à porta, suplicando que lhe emprestasse  cem mil-réis, para se ver livre de uma penhora, e poder comprar o material que precisava para os trabalhos de sua profissão.

– Em vez de cem-mil réis, dar-te-ei um conto de réis, Augusto; disse o barão,  com a condição, porém, que, se eu morrer primeiro, você irá vigiar meu túmulo, nas três  primeiras noites depois do meu enterro.

O sapateiro prometeu, acossado como estava pela necessidade, e o fidalgo deu[1]lhe o conto de réis.

Dois meses depois, o barão de Macário morreu; e Augusto, lembrando-se de sua  promessa, como era homem de promessa, foi cumpri-la.

Duas noites passou ele em claro, no cemitério da cidade, cheio de medo, mas sem que ocorresse novidade alguma.

Na terceira e última, dirigia-se para ir velar junto no túmulo, quando avistou um  soldado encostado a um mausoléu.

– Eh! camarada! bradou. Que fazes aí? Não tens medo de estar no cemitério?

– Eu não tenho medo de coisa alguma, respondeu o militar. Vim para aqui, porque não tenho onde pousar esta noite.

Puseram-se ambos a conversar, enquanto o sapateiro contava ao soldado por que motivo ali se achava.

Passou-se o tempo, sem que eles o sentissem, quando o relógio da torre da igreja bateu compassadamente as doze badaladas fúnebres da hora terrível da meia-noite!...

Então, nesse momento, próximo deles surgiu de súbito, sem que soubessem de onde vinha, um homem vestido de vermelho, com os olhos chispando fogo, e cheirando fortemente a enxofre.

Era o diabo, que lhes ordenou:

– Retirem-se daqui, rapazes! A alma deste homem, que foi um grande usurário na  terra, pertence-me, e eu vim buscá-la.

– Senhor vestido de vermelho, disse o soldado, o senhor não é meu superior, nem mesmo um oficial. Não posso, pois, obedecer-lhe; e, assim, digo-lhe que se retire  daqui, pois aqui chegamos primeiro.

O diabo, vendo aquele militar destemido, não quis puxar barulho, e lembrou-se  de comprá-lo, perguntando-lhe quanto queria para se ir embora.

– Aceito o negócio que me propõe, sr. Satanás. Basta que me dê o dinheiro em  ouro, que uma das minhas botas puder conter.

O diabo saiu, e foi pedir emprestado a um judeu seu amigo, que morava naquela  mesma cidade.

Enquanto não vinha, o soldado puxando o rifle, cortou a sola do pé direito, e  colocou-a por cima de um túmulo aberto.

Quando Satanás chegou, vergado ao peso de um saco de ouro, esvaziou-a, peça  por peça, dentro da bota. O dinheiro caía todo na sepultura.

– Olé! disse o capataz do Inferno, esta bota parece-me mágica!

– Vá buscar mais ... mandou o soldado.

Mais de dez sacos foram assim trazidos pelo diabo. As moedas escorregavam pelo cano da bota, e iam cair no túmulo, de modo que a bota jamais se enchia. Satanás,  desesperado, ia trazendo saco por saco. Na ocasião em que carregava o décimo saco, cheio de moedas de ouro, eis que amanheceu de repente. O galo cantou; o sol rompeu; e o sino da igreja bateu alegremente, chamando para a missa.

Satanás deu um berro e desapareceu...

Estava salva a alma do barão de Macário...

O soldado e o sapateiro Augusto repartiram entre si a grande fortuna que o diabo deixara na cova; e foram viver ricos e felizes, empregando uma boa parte do dinheiro em dar esmolas aos pobres.

 

HISTÓRIAS DA AVOZINHA - Figueiredo Pimentel

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2022

A Roupa de Gandhi

 


 

Mahatma Gandhi provou que a "roupa não faz o homem". 

Ele só usava uma tanga a fim de se identificar com as massas simples da Índia.

Certa vez ele chegou assim vestido numa festa dada pelo governador inglês. 

Os criados não o deixaram entrar.

Ele voltou para casa e enviou um pacote ao governador, por um mensageiro.

Dentro continha um terno.

O governador ligou para a casa dele e perguntou-lhe o significado do embrulho.

O grande homem respondeu:

- Fui convidado para a sua festa, mas não me permitiram entrar por causa da minha roupa. 

Se é a roupa que vale, eu lhe enviei o meu terno.

 

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2022

Conversinha mineira

 


Conversinha mineira

- É bom mesmo o cafezinho daqui, meu amigo?

- Sei dizer não senhor: não tomo café.

- Você é dono do café, não sabe dizer?

- Ninguém tem reclamado dele não senhor.

- Então me dá café com leite, pão e manteiga.

- Café com leite só se for sem leite.

- Não tem leite?

- Hoje, não senhor.

- Por que hoje não?

- Porque hoje o leiteiro não veio.

- Ontem ele veio?

- Ontem não.

- Quando é que ele vem?

- Tem dia certo não senhor. Às vezes vem, às vezes não vem. Só que no dia que devia vir em geral não vem.

- Mas ali fora está escrito "Leiteria"!

- Ah, isto está sim senhor.

- Quando é que tem leite? 

- Quando leiteiro vem.

- Tem ali um sujeito comendo coalhada. É feita de quê? 

- O quê: coalhada? Então o senhor não sabe de que é feita a coalhada?

- Está bem, você ganhou. Me traz um café com leite sem leite. Escuta uma coisa: como é que vai indo a política aqui na sua cidade? :

- Sei dizer não senhor: eu não sou daqui.

- E há quanto tempo o senhor mora aqui?

- Vai para uns quinze anos. Isto é, não posso garantir com certeza: um pouco mais, um pouco menos.

- Já dava para saber como vai indo a situação, não acha?

- Ah, o senhor fala a situação? Dizem que vai bem.

- Para que Partido.

- Para todos os Partidos, parece.

- Eu gostaria de saber quem é que vai ganhar a eleição aqui.

- Eu também gostaria. Uns falam que é um, outros falam que outro. Nessa mexida...

- E o Prefeito?

- Que é que tem o Prefeito?

- Que tal é o Prefeito daqui?

- O Prefeito? É tal e qual eles falam dele.

-  Que é que falam dele?

- Dele? Uai, esse trem todo que falam de tudo quanto é Prefeito.

-Você, certamente, já tem candidato.

-Quem, eu? Estou esperando as plataformas.

- Mas tem ali o retraio de um candidato dependurado na parede, que his­tória é essa?

- Aonde, ali? Ué, gente: penduraram isso aí...

 

(Em Para Gostar de Ler, v. 7. São Paulo, Ática, 1979.)


terça-feira, 8 de fevereiro de 2022

A lenda "O pacto do Gato com o Diabo"

 

Era uma vez uma mulher que morava sozinha com seu bebê e seu gato, em uma casinha no meio da floresta.

Um dia ela teve que sair, mas estava muito preocupada porque não queria deixar o bebê sozinho, mas também não podia levá-lo para onde estava indo. Então ela olhou para seu animal de estimação e disse:

"Meu gatinho, por favor, cuide do meu bebê, estarei de volta em breve." e saiu de casa.

Logo após a saída da mulher, o diabo apareceu na casa e o gato, ao vê-lo, pulou na frente do berço da criança sem se intimidar (pois é certo que os gatos são os únicos animais que não têm medo desse ser tão malvado).

-Que é o que você quer? - O gato perguntou.

"Eu vim levar esse bebê comigo!"

"Bem, você não pode, porque estou cuidando dele", disse o gato pouco antes de lamber a pata.

- Animal insolente, você não pode fazer nada para evitá-lo-.

-Muito bem-. disse o gato astutamente, "Eu proponho uma coisa a você: se você adivinhar o número exato de pelos que eu tenho em todo o meu corpo, você pode levar o bebê com você." Mas se você falhar, irá embora e nunca mais aparecerá por aqui. Vou te dar três chances de adivinhar. Nós temos um acordo?-.

O diabo, que nunca resistiu aos desafios, aceitou achando que seria fácil. E com muita paciência, ele começou a contar os pelos do gato.

"Um ... dois ... três ..." então um pássaro cantou na janela, distraindo-o e fazendo-o perder a conta.

"Você desperdiçou uma chance." disse o gatinho.

Zangado, o diabo começou a contar novamente.

-Duzentos ... trezentos- ... quatrocentos...

Naquele momento, o vento entrou pela janela e bagunçou os pêlos do gato, fazendo com que o malvado perdesse o rastro mais uma vez.

"Você já teve duas chances." o gato o lembrou.

Nervoso, o diabo começou a contar novamente, prometendo a si mesmo que nada o distrairia.

-Um milhão ... dois milhões ... três milhões- ...

Então o gato abanou suavemente o rabo, escovando o nariz, e o diabo espirrou ruidosamente, fazendo com que o gato soltasse os pelos.

-Você perdeu sua última chance. Agora saia desta casa e nunca mais volte.

O diabo ficou tão furioso por ter perdido, que ali mesmo deu um chilique de proporções épicas ... mas não podia tocar no bebê, porque um trato com o diabo é sempre cumprido ... por ambas as partes. Claro, ele voltou para o inferno jurando para o gato que um dia ele iria adivinhar quantos pelos ele tinha e quando isso acontecesse, sua vingança seria terrível.

Quando a mulher voltou para casa, sem saber de nada do ocorrido, ela beijou e abraçou seu filhinho, agradecendo o gatinho com um carinho atrás das orelhas por ser uma babá tão boa.

É por isso que os gatos até hoje trocam de pelos o tempo todo. Pois assim o diabo nunca cumprirá sua vingança por não saber quantos fios de pelos ele realmente tem.

Crédito: fatos reais e sobrenaturais

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2022

A VOZ QUE VEIO DO ALÉM

 


Em Santa Maria do Tabuí há muito tempo atrás, Seu Nicolino era o padeiro. Baixinho,  rechonchudo e careca. Um batalhador. De domingo a domingo, saía no lusco-fusco da madrugada para entregar o pão que iria forrar o estômago de muito cidadão tabuiense.

Seis horas de uma manhã cinzenta e triste, daquelas que prenunciam tempestade. Lá ia o Nicolino, passando pelo velho cemitério, carregando nas costas um bitelo dum jacá cheio de pães ainda  quentinhos. Ninguém pelas redondezas. Nenhuma alma viva a não ser ele. De vez em quando seu Nicolino, como que para espantar algum fantasma, gritava:

- Padeiro-ô-ô!...

Bem ao lado do cemitério mal cuidado, com os muros caindo, seu Nicolino, meio ressabiado, teve a impressão de ter sido chamado lá de dentro. Arrepiou-se todo. Mas controlou-se, equilibrou o coração e o jacá na cabeça. Ia saindo de fininho quando ouviu uma voz fraquinha, como um sopro de alma sem descanso, perguntar de dentro  do cemitério:

- Tem pão dormido?...

Seu Nicolino empacou. Cortou a respiração enquanto o coração ficava todo descontrolado, a mente queria ganhar mundo e as pernas viravam molambo. Queria andar mas não conseguia. O jacá de pães parecia pesar toneladas.

Assim que conseguiu botar em ordem o pensamento e começar a ganhar cor novamente, ouviu a mesma vozinha sem-vergonha:

- Tem pão dormido?...

Foi a conta para o coitado do padeiro. Pinchou bem longe o jacá de pães e... sebo nas canelas rua abaixo, numa correria despinguelada. Os cabelos que ainda restavam na cabeça lustrosa  lembravam um porco espinho.

E enquanto corria com as pernas curtas e balançando a pança, uma sonora gargalhada estridente quebrou o silêncio do cemitério deserto. Mais tarde, quando tudo se esclareceu, seu Nicolino queria porque queria dar um tiro no pobre do coveiro  que acordara de madrugada para trabalhar, estava com fome e apenas queria comer um pãozinho mais barato, o pão dormido...

domingo, 6 de fevereiro de 2022

A lição dos balões

 




Era uma tarde de domingo e o parque estava repleto de pessoas que aproveitavam o dia ensolarado para passear e levar seus filhos para brincar.

O vendedor de balões havia chegado cedo, aproveitando a clientela infantil para oferecer seu produto e defender o pão de cada dia.

Como bom comerciante, chamava atenção da garotada soltando balões para que se elevassem no ar, anunciando que o produto estava à venda.

Não muito longe do carrinho, um garoto negro observava com atenção.

Acompanhou um balão vermelho soltar-se das mãos do vendedor e elevar-se lentamente pelos ares.

Alguns minutos depois, um azul, logo mais um amarelo, e finalmente um balão de cor branca.

Intrigado, o menino notou que havia um balão de cor preta que o vendedor não soltava. Aproximou-se meio sem jeito e perguntou: "moço, se o senhor soltasse o balão preto, ele subiria tanto quanto os outros?"

O vendedor sorriu, como quem compreendia a preocupação do garoto, arrebentou a linha que prendia o balão preto e, enquanto ele se elevava no ar, disse-lhe:

"Não é a cor, filho, é o que está dentro dele que o faz subir."

O menino deu um sorriso de satisfação, agradeceu ao vendedor e saiu saltitando, para confundir-se com a garotada que coloria o parque naquela tarde ensolarada.


// fonte :
http://www.melodia.com.br