Em Santa Maria do Tabuí há muito tempo atrás, Seu Nicolino era o padeiro. Baixinho, rechonchudo e careca. Um batalhador. De domingo a domingo, saía no lusco-fusco da madrugada para entregar o pão que iria forrar o estômago de muito cidadão tabuiense.
Seis horas de uma manhã cinzenta e triste, daquelas que prenunciam
tempestade. Lá ia o Nicolino, passando pelo velho cemitério, carregando nas
costas um bitelo dum jacá cheio de pães ainda quentinhos. Ninguém pelas redondezas. Nenhuma
alma viva a não ser ele. De vez em quando seu Nicolino, como que para espantar
algum fantasma, gritava:
- Padeiro-ô-ô!...
Bem ao lado do cemitério mal cuidado, com os muros caindo, seu
Nicolino, meio ressabiado, teve a impressão de ter sido chamado lá de dentro.
Arrepiou-se todo. Mas controlou-se, equilibrou o coração e o jacá na cabeça. Ia
saindo de fininho quando ouviu uma voz fraquinha, como um sopro de alma sem
descanso, perguntar de dentro do
cemitério:
- Tem pão dormido?...
Seu Nicolino empacou. Cortou a respiração enquanto o coração
ficava todo descontrolado, a mente queria ganhar mundo e as pernas viravam
molambo. Queria andar mas não conseguia. O jacá de pães parecia pesar
toneladas.
Assim que conseguiu botar em ordem o pensamento e começar a ganhar
cor novamente, ouviu a mesma vozinha sem-vergonha:
- Tem pão dormido?...
Foi a conta para o coitado do padeiro. Pinchou bem longe o jacá de
pães e... sebo nas canelas rua abaixo, numa correria despinguelada. Os cabelos
que ainda restavam na cabeça lustrosa lembravam
um porco espinho.
E enquanto corria com as pernas curtas e balançando a pança, uma
sonora gargalhada estridente quebrou o silêncio do cemitério deserto. Mais
tarde, quando tudo se esclareceu, seu Nicolino queria porque queria dar um tiro
no pobre do coveiro que acordara de
madrugada para trabalhar, estava com fome e apenas queria comer um pãozinho
mais barato, o pão dormido...
Nenhum comentário:
Postar um comentário